O Estado angolano precisa endividar-se em 3,929 biliões de kwanzas (11.100 milhões de euros) em 2019, equivalente a 34,6% das receitas do Orçamento Geral do Estado (OGE), segundo a proposta que o Governo entregou na Assembleia Nacional na quarta-feira.
A informação consta conta do relatório de fundamentação da proposta de OGE para 2019, e contrasta com as necessidades de financiamento (interno e externo) que o Governo inscreveu no Orçamento em vigor este ano, prevendo então endividar-se em mais de 4,780 biliões de kwanzas (mais de 25.500 milhões de euros, à taxa de câmbio de Dezembro de 2017), o equivalente a 49,4% de todas as necessidades de financiamento.
Para 2019, o Governo angolano estima financiar-se internamente em 1,934 biliões de kwanzas (5.500 milhões de euros) e no exterior em 1,995 biliões de kwanzas (5.680 milhões de euros).
No relatório de fundamentação da proposta de OGE, o Governo angolano refere igualmente que a partir do ano 2019, a implementação das reformas económicas definidas no Programa de Estabilização Macroeconómica (PEM) “contará com o apoio financeiro e técnico” do Fundo Monetário Internacional (FMI), através de um Programa de Financiamento Ampliado (Extended Fund Facility – EFF), que se encontra em negociação com aquele organismo.
“O OGE 2019 está feito com base em medidas que, embora ainda não formalmente aprovadas pelo Conselho de Administração do FMI, foram já aceites por ambas as partes durante as negociações em curso”, lê-se no relatório de fundamentação.
Uma missão do FMI esteve já em Luanda, no final de Setembro, para negociar com o Governo o programa de financiamento a três anos, de até 4.500 milhões de dólares (3.940 milhões de euros).
Na proposta de OGE para 2019, o Governo prevê arrecadar receitas fiscais – impostos, contribuições sociais e outras – de mais de 7,423 biliões de kwanzas (21.100 milhões de euros).
Este Orçamento, que ainda terá de ser discutido e votado, até Dezembro, na Assembleia Nacional, contempla despesas e receitas no montante de 11,345 biliões de kwanzas (32.340 milhões de euros), um aumento absoluto de 17,1% relativamente ao OGE de 2018.
O Governo espera ainda um superavit de 1,5% do Produto Interno Bruto nas contas públicas de 2019 e um crescimento económico de 2,8%.
Em teoria as contas vão bem, obrigado!
A proposta do OGE para 2019 reflecte um aumento de 17,2% em relação ao de 2018 e projecta um “saldo global positivo de 1,45%” do PIB, explicou hoje uma fonte governamental.
A informação foi transmitida hoje pelo ministro das Finanças, Archer Mangueira, durante a cerimónia de abertura do 3.º Fórum Seguros, promovido em Luanda pelo semanário “Expansão” sob o lema “Resseguro e Cosseguro – Os Segredos das Seguradoras”.
De acordo com o governante, a proposta do OGE, que estima receitas e despesas globais de 32,2 mil milhões de euros, o aumento de 17,2%, comparando ao OGE de 2018, traduz-se no “esforço do Governo em consolidar as contas públicas”.
“Se tivermos em conta a inflação que este ano se projecta seja de 23%, e com importante ajustamento cambial entretanto ocorrido, teremos, então, a verdadeira dimensão desse esforço de consolidação”, disse.
Entre os principais indicadores do quadro macroeconómicos para 2019, Archer Mangueira destacou a projecção de um saldo global positivo de 1,45% do PIB, referindo que cumpre o objectivo de “gerar excedentes” para a redução dos níveis de endividamento do Estado.
Com as autoridades a projectarem o Orçamento “sem défice”, o previsto “superavit”, realçou o governante, “poderá contribuir, em termos realistas, para o regresso aos estabilizadores automáticos”, bem como “fornecer uma alternativa perante eventuais desvios na receita de financiamento ou na receita fiscal petrolífera e não petrolífera”.
O ministro das Finanças estimou também que as necessidades brutas de financiamento previstas para 2019 “equivalem a 12% do PIB”, sendo que as necessidades líquidas “devem ascender a 1% do PIB”. Deste modo, assegurou, Angola “estará em condições de inverter o ciclo de endividamento”.
O aumento substancial da despesa social do OGE 2019, com “grandes incidências” nos sectores da Saúde, Educação e do apoio do desenvolvimento de uma rede de segurança social “para os demais vulneráveis”, foram também sublinhados pelo governante.
Na sua intervenção, garantiu igualmente que a proposta do OGE 2019 contempla também “recursos suficientes” para a continuação dos investimentos estruturantes, bem como para o cumprimento do calendário de “regulação dos atrasados internos”.
As previsões macroeconómicas para 2019, realçou, assinalam a retoma do crescimento e do PIB a uma taxa de 2,8% em termos reais.
Apesar dos indicadores, Archer Mangueira fez saber ainda que, para a execução do OGE 2019, existem seis principais desafios a que o Governo está a “dedicar atenção”, entre eles a volatilidade do preço do petróleo e a quebra da produção petrolífera.
O crescimento lento do PIB não petrolífero, a depreciação cambial, a aplicação de procedimentos mais eficientes na gestão dos desembolsos externos, condições de liquidez mais limitada no mercado interno são também alguns desses desafios.
A entrada em vigor do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), a partir de 2019, segundo o ministro, é o sexto desafio na execução do OGE 2019.
“Tudo se inscreve no esforço para a consolidação de um sistema tributário mais justo e eficiente com os primeiros resultados esperados em 2019”, rematou.
Sair do “vermelho”. Sim, talvez em 2020
As contas públicas só deverão sair do vermelho em 2020, com as receitas, sobretudo de impostos, a voltarem a ser superiores às despesas totais previstas seis anos depois, segundo a mais recente projecção do Governo.
A informação consta do Plano de Desenvolvimento Nacional (PDN) 2018-2022 contendo um conjunto de programas com a estratégia governamental para o (suposto) desenvolvimento nacional na actual legislatura. A sua validade depende da boa sorte já que a má sorte é tão velha (43 anos) que um dia desta acabará…
Para 2018, o Governo prevê (previa) uma receita total (excluindo endividamento) de 20,2% do Produto Interno Bruto (PIB), essencialmente – como sempre – de impostos com a exportação de petróleo (12,6%), enquanto as despesas totais deverão ascender a 22,7% do PIB, provocando um défice fiscal de 2,5%.
Para 2019, a projecção do PDN apontava numa das suas diversas estimativas e cálculos para um défice de 1,5% do PIB, com o peso das receitas a caírem para 18,6% e o das despesas totais para 20,1%.
Após cinco anos de contas no vermelho, o Governo estima um resultado positivo em 2020, voltando as receitas a superar as despesas, equivalente a 0,4% do PIB, projecção que sobe para 0,5% em 2021 e para 0,7% em 2022.
O optimismo está, portanto, em alta. Em matéria de previsões, de contas e de estatísticas o MPLA sempre foi imbatível. Tão imbatível que em 43 anos de independência e 16 de paz total e de submissão esclavagista dos partidos da Oposição, conseguiu fazer com que o país “apenas” tenha 20 milhões de pobres.
Angola registou excedentes orçamentais em 2010 (5% do PIB), em 2011 (10%) e 2012 (7%), com a recuperação do sector petrolífero após as quebras de 2008 e 2009, tendo ficado próximo do equilíbrio em 2013.
A partir de 2014, com nova quebra nas receitas com a exportação do único produto que mantém o país vivo, o petróleo, as contas anuais do Estado voltaram a apresentar consecutivamente défices, colmatados com a contracção de endividamento público e, claro, com a institucionalização da obrigatoriedade de quase todos os angolanos terem de apender a viver sem comer e a morrer sem darem despesa ao Estado.
O Governo do MPLA (o único que os angolanos conhecem) estima (estimava) fechar 2018 com um endividamento público de 77.300 milhões de dólares (65.100 milhões de euros), equivalente a 70,8% do PIB do país para este ano, excluindo (é claro) a dívida da petrolífera estatal Sonangol.
De acordo com informação recente do Governo, a República de Angola deverá “aumentar significativamente” os empréstimos em 2018 e nos próximos anos.
Acrescenta que numa recente estimativa governamental, o Estado captou aproximadamente 3.400 milhões de dólares (2.800 milhões de euros) de dívida no primeiro trimestre deste ano, dos quais 1.300 milhões de dólares (1.000 milhões de euros) foram arrecadados no mercado interno e aproximadamente 2.100 milhões (1.800 milhões de euros) foram levantados externamente.
Só a China já emprestou a Angola, desde 1983, mais de 60.000 milhões de dólares (50.000 milhões de euros), para obras de reconstrução após a guerra, valores que por norma são liquidados pelo Estado angolano com carregamentos de petróleo.
E a ética das contas públicas?
O ministro das Finanças de Angola, Archer Mangueira, considerou no passado dia 24 de Maio ser urgente instituir uma ética de valor acrescentado entre os gestores das finanças públicas, para que os objectivos de boa governação sejam atingidos.
Para o ministro, “há um longo caminho a percorrer em matéria de capacitação de quadros para gestão das finanças públicas”. E, é claro, só agora talvez seja possível iniciar esse “longo caminho” que há décadas deveria ter sido iniciado.
Archer Mangueira realçou ainda que “não cabe, à luz do princípio da eficiência, despender mais recursos dos que estritamente necessários para alcançar os objectivos estabelecidos e obter os resultados esperados”.
Segundo o ministro, o princípio da economia conduz a que os meios utilizados por cada instituição, no desempenho das suas responsabilidades devem estar disponíveis em tempo útil, nas quantidades e qualidades adequadas e ao melhor preço.
“Uma gestão assim exercida tem subjacente uma ética de valor acrescentado, mediante a qual não é apropriável o que é alheio, não é individual o que é comunitário”, disse Archer Mangueira, acrescentando que não é igualmente “aceitável o desperdício, porque isso, no limite, pode conduzir à estafa fiscal”.
Archer Mangueira disse que os investimentos públicos têm de passar a ter uma repercussão concreta na execução de novas indústrias, na criação de emprego e na melhoria das condições de vida dos angolanos.
“Estamos a tomar medidas para reforçar o combate aos erros propositados, às práticas ilícitas, aos actos fraudulentos de gestão, entre outras práticas não recomendáveis”, referiu.
Folha 8 com Lusa